(outro email, continuação do O primeiro email)
Querido Pe. João,
O feriado de carnaval e trabalhos domésticos não me permitiam continuar escrevendo. Desculpe-me o intervalo tao logo.
Querido Pe. João,
Foto: Windows 7 |
Então, desde que denunciei os
dois, meu relacionamento com minha mãe foi marcado por muita dor e em
alguns raros momentos ela usava de bondade.
Nos primeiros anos eu tentei
desesperadamente receber atenção e amor dela, depois, com quase 16 anos,
fui uma completa rebelde, ao ponto de parentes e amigos da família
perceberem. Ela explicava para todos que eu era assim porque
tinha vergonha dos "pais pobres e ignorantes", tinha vergonha das mãos
sujas de óleo diesel do pai. E ela falava isto na minha frente pois não
tinha a menor dúvida de que eu (mesmo rebelde) não denunciaria à outras pessoas o que havia acontecido.
Foi com esta confiança e certeza, que ela impôs para mim a culpa e a vergonha,
para me calar e até tentou me fazer acreditar que não havia acontecido
nada. Um exemplo disto: ela disse que conversou com Pe. Lucas e ele
disse que eu poderia ter "fantasiado", ..., que nada aconteceu. Se isto
foi verdade, se realmente ela falou para ele, talvez não foi clara para
ele entender a gravidade dos fatos. Ela se agarrou como uma salvação,
afinal era o padre, autoridade que disse.
Eu me lembro das crises de
depressão que eu sofria, ..., nem sabia o que estava sentindo, chorava
sem parar, na escola, na igreja, na catequese, chorava em casa
escondido. A mãe só pensou em um tratamento para mim quando eu tinha
crises de pânico associada à depressão. Ela achava que eu estava ficando
louca ou possuída por espíritos. Ela pediu aos irmãos que me tratassem
bem (a Nicole me contou só agora).
Lógicamente, ela me levou
primeiro num feiticeiro que tirava espíritos, depois me levou aos
kardecistas (seguidores de Allan Kardec). Eu estava tão frágil que ia
sem contestar. É interessante lembrar que ela não me levou para grupos
de oração, agora não sei porque. Também me levou num psicólogo que
alguém indicou, ele não cobrava dinheiro, eu não confiei nele e não
falei absolutamente nada para ele, eu tinha medo de ser mais um abusador (sinceramente).
Aí o Pe. Luiz apareceu pela
casa do Centro por alguns dias e eu fui lá com ele e contei
(honestamente não lembro até que ponto falei, como falei, mas falei do
abuso sexual). Eu me lembro que ele falou apenas de "perdão", que a cura era o "perdão".
Ofereceu uma amiga freira e
psicóloga para eu conversar, me tratar. Fui 4 vezes, mas logo ela disse
que ia se mudar do Amazonas e não podia mais me ajudar. Cresci em algum
conhecimento do que estava acontecendo comigo, do que aconteceu, entendi
que a tristeza e choro era "depressão", que eu tinha muitas coisas
especiais dentro de mim e que ia superar e ser feliz.
Eu estava com 14 anos, o Fábio
ainda me perseguia, a mãe me desprezava e o pai já sentia medo de minhas
atitudes e nem chegava perto.
Pedi socorro do Pe. Luiz, ele
não entendeu, conversei com a freira amiga dele, ela também não chegou a
suspeitar que eu precisava de ajuda ainda. Talvez eu não fui clara na
minha denúncia, o Pe. Luiz só falou de amor e perdão, e eu não sei se
ele falou com meus pais, eu não tenho a menor pista se isto aconteceu.
Eu não tive ajuda Pe. João,
ninguém me ajudou, fiquei na infância, na adolescência, até o início da
faculdade, sem nenhuma assistência médica, psicológica, social. Os
valores afetivos estavam confusos, o meu desenvolvimento emocional foi
doentio.
(continuo ...)
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