(depois de A surra, eu continuo e concluo o email mais longo e doloroso da minha vida)
Querido Pe. João,
Antes de dar continuidade ao email anterior sinto necessidade de dizer-lhe algumas palavras:
Escrever-lhe tem sido como uma
terapia. Tenho colocado as minhas lembranças e as idéias em certa
ordem, esclarecendo para mim mesma o novo sentimento que devo ter em
relação ao meu trauma.
Continuo lendo artigos do
Jacques Poujol, com a dificuldade de encontrar tempo para acessar a
internet e ainda traduzir os textos, do francês para o português.
Li em um dos textos que diz: "... no campo psicossocial, o incesto é uma situação com que poucos profissionais de saúde mental gosta de ser confrontado. É difícil manter-se neutro em
relação ao incesto. O ato automaticamente desperta em todos nós o que seria chamado por alguns como uma "contra-transferência negativa", onde a incompreensão, raiva e indignação se misturam. Estas situações são delicadas e muitas vezes espinhosos, e tratá-los é um caminho cheio de armadilhas e emboscadas."
Pensei imediatamente no senhor, e se estou causando-lhe sofrimento pelas terríveis revelações. Tem
quase um mês que a Nicole deixou de falar comigo. Ela pediu para eu não
tocar mais no assunto com ela, disse que já estava causando problemas
entre ela e o esposo. Foi para ela que eu iniciei a conversa sobre as
minhas recordações,..., ela chorava junto comigo, me apoiava e
recriminava os nossos pais. Porém, ela não quis mais continuar, está me
evitando completamente. Por este motivo me senti "afundando completamente" e escrevi para o senhor.
Ela deve estar sofrendo tanto, e eu sinto muito. Nós não estávamos nos ajudando mutuamente, foi melhor assim.
Li
também que ser ouvida é muito muito importante no processo de cura. Eu
realmente não estou criando uma grande expectativa sobre o que senhor
vai me responder, nem sei se o senhor é psicólogo, mas sei que tem Deus
no coração e uma vida de doação ao trabalho da caridade. Eu sei, mais e
mais, que este assunto é terrivelmente difícil até para psicoterapeutas.
Quando estou preparando um
email para o senhor eu estou me lembrando, expondo vários sentimentos
sobre as recordações, me permitindo ter raiva, nojo, indignação, até
culpa. É este o caminho, tem que ser este, eu estou me agarrando com
muita esperança nas palavras deste terapeuta de larga experiência. E
estou me preparando para o mais importante passo: conversar com os meus pais e irmãos sobre o assunto.
Esta conversa vai ser muito
importante para mim, pois quero abolir todos os fantasmas que estão ao
redor de mim, em sonhos e tormentos psicossomáticos.
Obrigada, abraços,
Flor
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