(continuação e conclusão de um testemunho de violência doméstica Vontade de esquecer)
A partir deste ponto não cabe mais uma narrativa tão detalhada, pois seria exaustivo e sem utilidade. Desde
 que fui morar em Florianopolis para frente, a minha rebeldia havia diminuído
 e o convívio ficou razoável, porém, sempre que havia uma discussão 
cotidiana a magoa do passado pesava.
Quando
 os meus pais foram para França (2005) eu estava tão feliz. Minha irmã casou-se com um francês e foi morar no sul da França. Todos nós estávamos em 
boa harmonia: meus pais, eu, Nicole e meus outros irmãos. Nicole até chorou muito no aeroporto na 
despedida, abraçou nossa mãe e não queria mais largar, tamanha era a sua dor, do pensamento de morar longe da mãe. 
Um ano depois os filhos gêmeos da Nicole nasceram e eu fui pedida em casamento naquele mesmo ano. Estava tudo “perfeito”.
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| Foto: pt.dreamstime.com | 
Lembro-me
 de dois momentos desta viagem com meus pais para a França, em que fiquei em estado de graça de tanta
 felicidade: (1) foi quando estávamos andando na rua principal de Paris, estava frio e cheio de decoração natalina, olhei para os dois 
encantados com tanta beleza, felizes, ..., eu só lembrava do quanto os 
dois haviam trabalhado, o quanto haviam sofrido privações e até humilhações por não terem estudo, eu podia proporcionar um pouco de 
felicidade na vida deles; (2) quando tivemos um dia em Roma, fiz todas 
as vontades dos meus pais, respeitando as limitações de cada um, eles estavam 
felizes eu vi, ...,  e ai a mãe olhou para mim e 
disse que não sabia que eu tinha tanta resistência para caminhar e ainda
 não me queixava
 de nada (rodamos a pé demais). Eu disse que ela sabia pouco sobre mim, 
eu me entristeci, mas fiquei um tanto feliz por ver que ela estava “olhando para mim finalmente”. 
Quando
 houve a minha cerimônia de casamento católico, fiz questão de entrar na 
igreja ao lado dos dois. Eu estava muito feliz, era um momento especial,
 eu não queria estragar nada, com as lembranças do passado. Porém eu não
 conseguia me imaginar entrando sozinha com o pai, para cumprir o 
costume, eu precisava de um apoio, no caso a mãe. Nem pensei em entrar 
sozinha, pois sabia que as pessoas iriam comentar, e até me julgar, 
visto que o pai é vivo. 
Enfim,
 tudo estava seguindo na mais perfeita ordem. Depois de casada morei na Holanda, depois em Florianopolis, onde fiquei grávida e os nossos planos de 
construir uma vida lá começaram a dar errado.  
Faltaram
 documentos para meu esposo trabalhar no Brasil e não me
 aceitaram para eu receber a bolsa de estudos só porque eu avisei que 
estava grávida. Estávamos sem dinheiro para continuar lá e viemos para 
Manaus, para a casa dos meus pais. 
Eu
 fiquei muito arrasada, até revoltada! Por que eu tinha que voltar para 
casa da minha família? Por que Deus estava me castigando assim (pensei 
eu, naquele momento)?   
Eu
 estava grávida e doente, o meu esposo tinha que trabalhar para finalizar o 
contrato e tínhamos que entregar o apartamento, então pedi para a mãe 
que viesse para  nos ajudar.  
O pai foi junto de “brinde”. Ele até ajudou no inicio, depois começou a reclamar. Na
 noite antes do retorno deles para Manaus, o pai falou-me palavras 
desagradáveis. Eu ouvi calada, mas fiquei furiosa, como ele podia me 
agredir se eu estava grávida, como ele foi egoísta. Foi exato neste 
momento que eu me permiti ter muito ódio dele, e toda aquela “paz e 
harmonia”  se dissiparam como “fumaça”.
Quando
 eu e meu marido chegamos a Manaus eu estava muito contrariada, enfurecida
 ainda, não falava com o pai, eu o ignorei completamente. A mãe estava 
divida, tentando estabelecer a paz, o que me irritava muito mais, pois 
ela usava a metodologia de sempre: ignorar os meus sentimentos e usar a 
Palavra de Deus acima de tudo, interpretando-A da forma que mais convêm.
  
O
 convívio ficou insuportável nos dois últimos meses antes do meu filho 
nascer. Eu estava com 20 dias de operada quando sai com o meu esposo para 
procurar um quarto para alugar. Ao completar 30 dias depois do 
nascimento do bebê nos mudamos. O meu esposo ainda não tinha o emprego, mas a
 qualquer custo saímos de lá. Fomos morar num quarto com o teto cheio de
 ratos e morcegos, mas era o que o dinheiro pagava. 
Chorei de tanto desgosto! 
Porque tinha que ser assim, porque a minha mãe não entende definitivamente que eu a amo, mas não posso “ser atriz do teatro que eles montaram” para que a sociedade não saiba o que aconteceu em casa. 
Eu
 precisei muitas vezes depois falar com a mãe e até da ajuda dela, ..., 
por telefone ou ao vivo, sempre acontecia um estresse, ela me provocava e
 nos agredíamos mutuamente. Eu já estava desesperada com esta situação e
 estava querendo pedir ajuda do Pe. Lucas para ele interceder no nosso 
relacionamento, tentar uma conversa neutra, pois eu já tinha gastado 
todo o meu bom senso e sem resultado.   
E foi por este motivo também que eu estava tão transtornada, ao ponto de me abrir para o senhor.  
Acabou.
Pe. João obrigada por me ouvir.
Abraços,
Maria

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