Outra consequncia, outro abuso, outra dor

Eu ainda não falei aqui sobre uma outra consequência:

Estimulada sexualmente, eu como criança acabei conhecendo meu corpo, cedo demais e de uma forma grotesca. Este "conhecer" significa sentir excitação. Formou-se um pensamento, um "caráter" dentro de mim, ..., vejam: eu estava sozinha neste pesadelo, sem orientação dos adultos que tinham que me ensinar e proteger. É claro que teriam consequências para todos, inclusive para mim.


Eu queria beijar, eu queria sentir a excitação, me estimular mas sem "eles" e ai tive a infeliz ideia de convidar minha irmã na brincadeira de casinha de boneca para eu ser o seu marido, vejam isso! não é o cumulo da perdição infantil! E ensinei ela gostar, ensinei ela beijar, se esfregar, se excitar como eu.

E como se dá o nome para isto? Abuso sexual de infantil para infantil? Ainda não achei um texto que fale disto. O que eu fui quando fiz isto? uma agressora sexual? Com o comportamento dos agressores eu aprendi, sim! eu aprendi a conquistar, a enganar, a obter sigilo tal como acontecia comigo.
Google Imagens


(A Maria Flor também feriu)

E não fiquei só com a minha irmã, tiveram outras crianças que eu ensinei o sigilo e o "namoro". Eu era mesmo criança de 7-10 anos, fazia na hora que brincávamos de casinha e nenhum adulto esta por perto.

Quando vejo minhas sobrinhas brincando com os primos de casinha eu fico ate esperta, de olho, pois quem pode saber se alguma dessas crianças já não teve a mesma triste experiência e difundir entre os inocentes que não tiveram.

O fato é que uma criança abusada sexualmente deixa de ser "inocente" pois foi iniciada cedo demais, sem amadurecimento apropriado, e pode sim  difundir o abuso entre os outros.

Vejam isso, eu estou ficando arrepiada de descrever isto, nunca nunca mesmo falei disto para ninguém, nem para mim mesma em um mero pensamento, e estou hoje aqui descrevendo e ficando assustada com as conclusões: uma criança abusada (nem sempre) pode fazer o mesmo que fazem com ela.

Criança, eu falei criança, eu só fiz estes namoros com outras crianças quando eu era criança. Pouco antes que eu "fiquei moça" (com a chegada das regras menstruais) eu já não fazia, tinha começado a mudar minha cabeça, eu pensava em namorar com um garoto da minha idade, viver um romance, como nos filmes e livros. Também se preocupava com coisas mais sérias como por exemplo: não engravidar dos agressores.
Houve também o momento que eu me dei conta como pessoa que estava fazendo algo tão errado quanto meus agressores, senti vergonha de mim, parei.

Coitada de mim! Coitada da minha irmã. Coitada de todas as famílias que passam por isto,  parece um sofrimento infinito.

A minha irmã, depois que crescemos, ...,  no período colegial e universitário, tivemos muitas diferenças, muitas brigas como todas irmãs, mas entre nós havia, e ainda há uma marca profunda, existente, persistente, que nos afasta completamente. Atualmente estamos afastadas, com sérios problemas de comunicação e conflitos de idéias. E fomos tão unidas, brigávamos, mas éramos unidas, nos protegíamos, nos ajudávamos incondicionalmente, mas sempre teve algo entre nós que não nos permitia consolidar um verdadeiro amor fraterno.

Sabe que visitei ela na casa dela na França com meu esposo e meu filho que tinha um aninho e ela me tratou muito mal, ela não conseguia esconder o seu desconforto. E ela ficou me olhando com um olhar de revolta e desconfiança quando os gêmios estavam perto de mim, brincando. Era só ódio dela, eu não estava sozinha com os filhos dela, estavam todos, meu filho, meu marido, o marido dela e ela. Pensando nisso vejo que era só ódio, ..., como eu disse: eu era criança, nem mocinha fiz mais isto, quanto mais como uma adulta, mãe, como ela podia achar que eu faria algo? Eu mereço (literalmente). Fico tentando imaginar o que esta rolando lá na casa dela agora, com os nossos pais lá, e tudo o que eles representam para ela.

Caríssimos, vejo que  vou ser sempre uma anônima, imaginem uma revelação dessas em uma família!
Eu ainda tenho muito mais para escrever, preciso disto, preciso arrancar estas dores, este peso insuportável.
Obrigada por lerem.
Nina, obrigada por divulgar no seu blog!

Maria Flor 



Comentários

  1. A divulgacao é infinitamente menor do que a necesissidade de se falar sobre esse tema horroroso, Maria Flor,portanto, nao há nada o que agradecer, querida.

    Olha, uma coisa é certa, vc nao teve culpa alguma, os agressores adultos que sao os "errados" na historia toda. Vc foi apenas cedo demais, estimulada, e é normal o que se passou durante e depois disso. Com sua irma e com outras criancas.

    Tente compreender sua irma atualmente, quem sabe uma conversa aberta e franca ajudaria? eu tbm teria medo de algo acontecesse com meus filhos. vc nao?
    Por causa disso, acho que vcs deveriam conversar.

    Um beijo

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    1. Teria medo sim, tenho medo. Tenho que conviver em família, visitar e receber visita dos meus pais e do meu irmão, é desconfortável sempre, mas ainda vale a pena pois eu gosto deles, gosto de viver em família.

      Tudo tem seu tempo, e o tempo de ter uma conversa franca ainda não chegou, mesmo que eu tenha tentado quando estive na casa dela. Vai acontecer, agora eu acredito, depois de ter esperado por tanto tempo para ter uma conversa em família.

      Obrigada, forte abraço,
      Maria

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  2. Oi Maria Flor, senti necessidade de responder a esse post por me identificar demasiadamente com ele do que com todos os outros daqui. Por volta dos meus 5 ou 6 anos, não sei ao certo, vivenciei algo parecido, mas da parte da sua irmã. Éramos ambas crianças e ela não devia ter mais de 7 ou 8 anos na época. A grande diferença talvez foi que toda brincadeira era explicitamente sexual. Infelizmente (ou felizmente, ainda não sei ao certo) eu não me recordo como isso tudo começou, apenas que da época que eu me lembro isso já era algo "normal" para nós "brincarmos".
    Ela sabia que era errado, já que só brincávamos quando estávamos sozinhas em casa. Meus pais trabalhavam juntos e normalmente só voltavam a noite, junto com os meus outros irmãos que já estudavam. A culpa começou a aparecer mais tarde, quando ela subitamente parou de brincar e passou a abominar o ato e acha-lo vergonhoso.
    Eu sempre me senti culpada na época da pré-adolescência e cheguei até a contestar a minha sexualidade por conta disso. Enquanto crescia senti diversas coisas que - agora imagino não serem propriamente comuns na puberdade - me sentia diferente de todos os outros, já sabia muito bem o que era sexo e tinha certo receio de homens mais velhos, me sentia um lixo por tudo isso, entre outras coisas.
    Senti sim depressão e morria de vontade de me cortar, ao mesmo tempo que tentava entender o que exatamente havia se passado, já que, como eu já disse, não me lembro de como tudo começou. Senti sim a vontade de cometer o suicídio, mas eu sentia medo demais dessa alternativa, não medo da morte, da dor, mas medo do que eu iria encontrar do outro lado - minha família inteira é espírita e o inferno dos suicidas é o pior que tem, ao que parece.
    Não escrevo na intenção de culpa-la, você ou minha irmã pelo ato - e nem sei se abusaram dela, mas pelas suas atitudes eu não ficaria muito surpresa - mas é fato que hoje isso é algo que simplesmente não é comentado e nem sei se um dia vou voltar a falar isso com ela, do por que ou como isso começou, talvez pelo medo da sua resposta. Não somos muito próximas, na realidade não me sinto próxima de ninguém da minha família realmente, mas nos últimos anos venho tentado ter mais contato com eles - aliás não com muito sucesso de fato.
    Senti mais a necessidade de desabafar sobre isso. Tenho dificuldade de relacionamento e tenho medo desse contato mais pessoal com qualquer outra pessoa, é estranhamente desconfortável para mim. Venho tentado mudar e aceitar e acreditar mais nas pessoas, ter mais contatos e ter mais amigos, mas isso é muito difícil para mim.
    Acho incrível o fato de você ter superado tudo isso sozinha, e ainda ter tido coragem para se expor ao mundo, conhecer pessoas, casar e ter um filho. E claro, se expor novamente através de um blog. Escrever até hoje foi o que me ajudou melhor a lidar e aceitar melhor o que aconteceu e espero que esteja te ajudando também. Continue com o blog pois pode ajudar muitas pessoas a lidarem com isso, já que é uma luta diária e que praticamente nunca tem fim.

    B.

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    1. Fiquei durante 18 dias sem Internet e por isto so pude ler completamente seu comentario agora. Obrigada Senhorita B., li atentamente o que voce escreveu, tentando encontrar em voce algum traco que me faca entender a minha propria irma, a minha vitima (meu computador nao tem acentos em portugues, sinto pelas palavras quase ilegiveis).

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    2. Flor, posso dizer que entendo plenamente tua irmã...tbm sofri abusos da minha irmã por 5 anos.ela já era adolescente(12 anos)e qd ela parou, eu estava com 7 anos,ela com 17.
      lembro que tentei me mexer e quebrei a regra dela: eu era uma boneca,não podia me mover,falar, nem chorar. Ela me varreu da cama e fui de encontro à parede, de cabeça. desmaiei. acordei com gelo na cabeça. ela disse a nossa mãe(que eu via apenas nos fins d semana, e por boa parte da infancia, minha "mãe" tinha sido a minha irmã) ela disse que eu havia caído da beliche.
      Ninguém me levou ao médico, ela me proibiu de falar que doía.A pancada foi tão forte que fiquei com sangue no olho por meses
      Não posso dizer o que sinto por ela,mas é um nojo completo, um asco...
      Não sei te dizer se ela sofreu algum tipo d abuso, mas posso te dizer que ela sabia o que fazia e que era errado... Eu tinha lembranças vagas de algo, mas não formavam o todo, mas ano passado,ao tentar ajudar alguém que passou por isso comecei a ser atormentada por lembranças,e essas a respeito de minha irmã foram e tem sido as que mais dóem no peito... graças a Deus hj moro em outro estado,mas não sei como reagirei,se ela vier de visita...só peço a Deus que ela não venha nunca mais.

      Donna.

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    3. Flor, voltei aqui apenas pra deixar claro que o que escrevi são meus sentimentos com respeito à minha irmã, não a vc,okay? Infelizmente esta é uma das consequências de quem foi abusado ...

      Voce descreveu o ódio dela,mas talvez, Flor,se voce puder mostrar a ela os sentimentos que vc tem em relação a toda forma de abuso e principalmente, pedir perdão a ela, acho que este ódio que ela sente diminuiria, e a ajudaria a ter paz, entende?Por isso, não deixe que o aparente ódio dela a desanime,ou a faça desistir dela! ela tbm deve sentir aquele sentimento de ambiguidade, que eu descobri aqui no seu blog,mas que é tão ruim de sentir qt de descrever; isso de amar e odiar...

      Ela vai entender que vc também sofre muito pro ter sido abusada e por ter abusado dela.Mas que a realidade das duas agora é a mesma:proteger, educar informar os filhos que tem, contra tais abusos e superar o trauma de um passado ruim,mas felizmente,passado.
      abraço,flor.

      Donna.

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